Estudo detalha impacto da urbanização para aves migratórias em praias do litoral paulista
19/07/2025
(Foto: Reprodução) Cientistas mediram impactos da urbanização das praias para aves costeiras
Karina Ávila
Um estudo recente publicado na revista Ornithology Research revelou um cenário alarmante para as aves migratórias que utilizam as praias do litoral paulista como ponto de descanso e alimentação.
Conduzida entre 2019 e 2022 por pesquisadores da UNESP e do Instituto de Pesca de São Paulo, a pesquisa mostra que praias com menor interferência humana concentram maior diversidade e abundância de aves. Acesse a pesquisa neste link.
Por outro lado, o turismo desordenado, a circulação de veículos e a presença de cães soltos espantam bandos inteiros e colocam em risco o ciclo de vida dessas espécies.
Trânsito de veículos também aparece como fator de estresse para as aves
Karina Ávila
A investigação científica foi coordenada pelo professor Edison Barbieri, referência em ecologia marinha e ornitologia, com a colaboração dos mestrandos Karina Ávila Esparza e Bruno Lima.
O grupo monitorou 15 km de praias nos municípios de Peruíbe (SP) e Itanhaém (SP), na Baixada Santista, e registrou mais de 10 mil indivíduos de 23 espécies da ordem Charadriiformes, sendo 20 delas migratórias oriundas do Hemisfério Norte.
“É um colapso ecológico silencioso. A ocupação humana desordenada está expulsando as aves de áreas críticas de alimentação e descanso”, alerta Barbieri.
Atropelamentos também foram relatados na pesquisa
Pedro Benhe
Praia do Tanigwá
Entre os trechos estudados, a Praia do Tanigwá, situada em uma área preservada da APA Marinha do Litoral Centro, se destacou como um verdadeiro refúgio.
O local apresentou os maiores índices de diversidade, riqueza e abundância de aves, incluindo espécies dominantes como a batuíra-de-bando (Charadrius semipalmatus) e o maçarico-branco (Calidris alba).
Ostraceiro-americano (Haematopus palliatus)
Karina Ávila
Já praias com maior grau de urbanização, como Ruínas e Gaivotas, tiveram índices significativamente mais baixos. Nessas áreas, a perturbação causada por carros, parapentes, animais domésticos e turistas foi associada ao aumento de comportamentos de alerta, fuga e estresse entre as aves.
A Praia do Tanigwá se destacou no estudo como o local com maior diversidade e abundância de aves migratórias e residentes, funcionando como um refúgio ecológico em meio à crescente urbanização do litoral paulista.
“Diferente das praias mais impactadas, Tanigwá ainda preserva trechos importantes de restinga e dunas, oferecendo abrigo, alimento e áreas de reprodução para aves limícolas, especialmente durante os meses mais críticos da migração (outubro a fevereiro)”, comenta o especialista.
Ameaças visíveis, consequências silenciosas
Entre os distúrbios registrados no estudo, os pesquisadores destacam:
Presença de pessoas (53,2% das ocorrências);
Cães soltos (17%);
Trânsito de veículos (12,2%);
Parapentes e bicicletas, que somam mais de 14% dos impactos observados.
Segundo Edison, um episódio grave observado em campo foi o registro de cães soltos atacando bandos de Charadrius semipalmatus na Praia do Gaivotas.
Cães soltos foram vistos perseguindo aves ameaçadas de extinção
Karina Ávila
“Esses eventos de perseguição por cães não apenas dispersam os bandos, como também comprometem profundamente o comportamento de repouso e alimentação, elevando o gasto energético das aves em períodos críticos da migração”. Além de atrapalhar migrações, esse estresse também impacta o forrageamento e reprodução dos animais.
Chamado à ação
Diante do cenário, os autores recomendam medidas urgentes de gestão ambiental:
Criação de zonas de exclusão temporária em áreas sensíveis;
Controle de veículos em praias;
Campanhas de educação ambiental voltadas ao turismo;
Fiscalização efetiva em Unidades de Conservação.
Segundo Barbieri, o Brasil precisa assumir o papel de liderança na proteção desses corredores ecológicos, já que muitas dessas aves fazem parte da Rede Hemisférica de Reservas para Aves Limícolas (WHSRN) e dependem das praias brasileiras para completar sua migração.
“A conservação dessas áreas não é só uma questão local, mas de responsabilidade internacional”, reforça.
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